Em 2018 era anunciada a chegada da Iomo às ruas de Lisboa enquanto primeiro fornecedor de um serviço, hoje bem conhecido por quem frequenta as ruas da capital – o aluguer de trotinetes elétricas através de uma app. A start-up portuguesa foi a primeira a chegar a território lisboeta, seguida por tantas outras empresas que vemos hoje representadas nas ruas pelas suas trotinetes, estacionadas em bando, quando não estão abandonadas no meio dos passeios.
O meio de transporte trotinete – trotineta se quisermos aportuguesar o termo ou patinete se quisermos ser mais originais – não é novo. Tinha eu quatro anos – ainda não tinha aprendido a arte de andar de bicicleta sem rodinhas – e era este o meu meio de locomoção predileto, na altura sem a componente elétrica. Questionava-me porque preferiam as pessoas as bicicletas, mas depois deparei-me com alguns inconvenientes associados às trotinetes como as subidas ingremes, os empedrados e a capacidade que tinham para ficar com a direção torta. Aprendi, entretanto, a referida arte e, por sua vez, a trotinete evoluiu, ganhando um pequeno motor, pneus que absorvem o impacto dos solos irregulares e uma maior robustez na construção.
Com estas melhorias, empreendedores decidiram tornar a trotinete numa fonte de rendimento, partilhando-a. Seguindo um dos princípios básicos da mobilidade partilhada – se um dado meio de transporte está parado na maior parte do tempo, não tendo qualquer utilidade, pode ser utilizado por terceiros durante esse período, com o objetivo de maximizar, ou pelo menos incrementar a sua utilidade.
Em meados de 2019 havia já cerca de uma dezena de operadores em Lisboa, representando uma frota conjunta estimada de 5500 veículos. Seguiam, e ainda seguem, todos a mesma lógica – o utilizador descarrega a app, associa um método de pagamento virtual, faz scan ao QR Code da trotinete que pretende utilizar e esta é desbloqueada, estando assim pronta a ser utilizada. O pagamento tem normalmente duas componentes – uma fixa, por cada desbloqueio; e uma variável, correspondente ao tempo de utilização. Foram várias as estratégias de entrada no mercado português, desde promoções nas primeiras utilizações à venda de pacotes de minutos de utilização na compra de um passe de transportes públicos, por exemplo.
A receção foi relativamente boa, não tendo sido de igual qualidade o respeito pelas boas práticas inerentes à sua utilização. O desconhecimento do código da estrada – que equipara este meio de locomoção a velocípedes, vulgo bicicletas – é o principal motivo para esta anarquia citadina. O primeiro problema reside no facto de os utilizadores fazerem muitas vezes uso dos passeios em vez de ciclovias ou estradas, não respeitando quem lá circula há mais anos – os peões. O estacionamento no fim do aluguer também é algo com que o comum transeunte tem de se preocupar, pois na maioria das vezes são deixadas ao acaso.
Uma vez que ainda não existe uma regulamentação específica, seria importante as empresas prestadoras deste serviço adotarem medidas que reduzam o impacto negativo deste meio de transporte nas cidades. Um manual de boas práticas, explicando de forma clara os locais indicados para conduzir trotinetes mitigaria o primeiro problema, e a definição de zonas de estacionamento mais limitadas resolveria o segundo. Para além da segurança e conforto para utilizadores e peões, estas medidas contribuíram também para uma maior durabilidade do material circulante.
Não sei se esta febre veio para ficar, mas enquanto a sociedade se decide se esta é uma forma eficiente de percorrer a famosa last mile e a tecnologia, atualmente a ser testada pela Tortoise em colaboração com a Go X, de as trotinetes regressarem sozinhas a um dado ponto de encontro não for adotada por todos os comercializadores do serviço, torna-se imperial aos utilizadores melhorarem a sua conduta e aprenderem a coexistir com peões e automóveis.
Filipe Zuzarte
Co-fundador, membro da Equipa Editorial e um dos "pseudo-especialistas em nada" que opinam na Enciclopédia Portuguesa de Microassuntos. Como interesses tem: Automóveis, Economia, Viagens e a criação de página de memes.